INPE substitui modelos matemáticos nacionais utilizados na previsão do tempo 
por modelo dos EUA

Gino Genaro (*)

Desde o dia 1° de agosto de 2018 o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), ligado ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), passou a utilizar um novo modelo matemático nas suas análises de previsão de tempo e clima. Este novo modelo, chamado WRF (Weather Research and Forecasting Model), foi cedido por agências dos Estados Unidos e adotado em substituição ao modelo BRAMS (Brazilian Developments on the Regional Atmospheric Modeling System), o qual, apesar de também ter sido desenvolvido no estrangeiro, vem sendo adaptado, melhorado e ajustado há anos por pesquisadores do INPE e de outras instituições científicas.

Fato é que a forma como a decisão sobre a troca de modelos no CPTEC foi adotada tem causado muitos protestos tanto de membros da comunidade técnico-científica, quanto da comunidade de usuários do modelo BRAMS (veja AQUI matéria a este respeito publicada na edição de setembro de 2018 do Jornal do SindCT). Com o objetivo de intermediar as discussões entre os gestores e corpo técnico do INPE com vistas a se reavaliar as decisões já tomadas, os representantes dos servidores junto ao Conselho Técnico-Científico (CTC) da instituição têm se reunido com as partes na busca por uma solução que venha ao encontro dos interesses dos pesquisadores, gestores e usuários.

Como resultado destas reuniões, os representantes dos servidores junto ao CTC publicaram o informe abaixo.

(*) É tecnologista sênior e representante dos servidores junto ao Conselho Técnico-Científico do INPE.

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Informe de reunião dos membros internos do CTC com as direções do INPE e CPTEC

Tendo sido procurados por servidores do CPTEC para tratar do processo de troca de modelos de previsão de clima e tempo, membros internos do CTC INPE solicitaram reunião com a Direção do Instituto e com o Coordenador do CPTEC. A reunião, realizada em 14 de agosto de 2018, contou com os servidores: Ricardo Galvão (diretor do INPE), Divino Moura (coordenador do CPTEC), Gilvan Sampaio, Luis Augusto Machado, Silvio Figueroa (chefes das divisões do CPTEC), Adalberto Comiran, Maria Lígia Moreira, Carlos Alexandre Wuensche, Marciana Ribeiro, Cláudia Vilega e Gino Genaro (membros internos do CTC). A pauta e discussões são apresentadas a seguir.

A reunião foi aberta com uma exposição dos membros internos do CTC  do que nos foi informado por servidores do CPTEC acerca da forma como se deu o processo que culminou na troca de modelos operacionais para previsão de clima e tempo no CPTEC, com a descontinuação dos modelos BRAMS e ETA e a adoção do modelo WRF. Foi informado que vários membros da comunidade técnico-científica daquela coordenação  e da comunidade de usuários têm contestado a forma como esta decisão foi tomada, segundo os quais, sem o devido debate entre as partes interessadas e que, no que diz respeito ao mérito, tal troca de modelos poderia trazer prejuízos irreparáveis tanto ao INPE e ao país (que podem perder espaço na prestação de serviços, bem como autonomia no domínio de modelagem), quanto aos usuários, que dependem dos resultados gerados pelos modelos até então em uso pelo Centro.

Foi também relatado que a comparação entre os modelos, levada a cabo por uma comissão técnica instituída pela direção do Centro, pode não ter levado em consideração todos os parâmetros necessários, e que a apresentação feita de seus resultados à comunidade do CPTEC não permitiu o devido debate sobre o tema. Com isso, a decisão foi adotada sem que muitos membros da comunidade diretamente ligados ao tema pudessem se manifestar adequadamente.

Feita esta introdução, o coordenador do CPTEC, Divino Moura, fez uma longa fala remontando ao histórico de criação do próprio Centro há 23 anos, ao papel que o Centro vem cumprindo na sociedade, que o mesmo tem de estar sempre buscando o estado da arte em termos de modelos de previsão, que não possui pessoal suficiente para manter em operação diferentes modelos, o que configuraria uma forma de se duplicar os meios para se atingir os mesmos fins, que os estudos de comparação entre os modelos deixaram claro as vantagens do modelo WRF sobre os modelos BRAMS e ETA, concluindo que muitas das críticas surgidas junto à comunidade de usuários destes modelos teriam surgido por indução de pessoas do CPTEC interessadas na manutenção destes modelos, o que poderia ser comprovado observando-se a semelhança dos textos das mensagens.

Em seguida foi feito um resumo dos trabalhos da comissão que avaliou os diferentes modelos por parte do chefe da Divisão de Modelagem e Desenvolvimento, Silvio Figueroa. O mesmo destacou tecnicamente o que, na opinião dele e da comissão, comprovariam a superioridade do modelo WRF sobre os demais (economia de esforço computacional, abordagem matemática mais moderna, utilizado largamente pelos organismos congêneres ao CPTEC nos principais países do mundo, capacidade de assimilação de dados globais, etc.). Destacou ainda que hoje os modelos BRAMS e ETA atendem mais a anseios individuais de núcleos de pesquisa do que propriamente aos interesses da instituição e do país.

Luis Augusto Machado (Chefe de Divisão de Satélites e Sistemas Ambientais) afirmou que, no período em que esteve à frente da coordenação do CPTEC, não teve a capacidade de implantar tais decisões, mesmo tendo consigo que seria o melhor para a instituição e para o país, e que já começavam a surgir outras instituições regionais no país rodando o modelo WRF com resoluções melhores que a do próprio CPTEC.

O chefe da Divisão de Operações, Gilvan Sampaio, destacou que já há muito tempo não existe um único cliente cadastrado para receber resultados do modelo BRAMS, apenas do ETA, e que este também deverá ser descontinuado operacionalmente, mas ainda sem data para que isto venha a ocorrer, que todos os usuários serão informados com a devida antecedência.

Por fim, Divino Moura defendeu o processo em que se deu a tomada de decisão de substituição dos modelos, informando que foi criada a comissão de especialistas, que fez a apresentação pública do relatório da comissão a toda a comunidade do CPTEC, que foi aberto espaço para que todos pudessem se manifestar, que apresentou e aprovou o assunto dentro do Comitê Assessor do CPTEC e que teria contado inclusive com o apoio dos membros eleitos deste comitê, que representam a comunidade do Centro.

Os membros internos do CTC reforçaram seu pedido para que fosse reaberto o debate deste tema junto à comunidade de interessados do CPTEC, em particular pela realização de um seminário, que poderia ser mediado pelos membros do CTC, onde todas as partes pudessem se manifestar, e, por fim, que este assunto fosse pautado em uma reunião plenária do CTC. Tanto o diretor do INPE quanto o coordenador do Centro se mostraram contrários a este encaminhamento, afirmando que "a decisão já estava tomada".

Com isto a reunião foi encerrada, sem que nenhum encaminhamento concreto fosse adotado.

Avaliação da reunião e próximos passos

- Do ponto de vista de se tentar reabrir a discussão sobre a mudança de modelos, apaziguando o clima junto à comunidade do CPTEC e de usuários, a reunião não surtiu efeito.

- Do ponto de vista técnico, os gestores apresentaram argumentos considerados relevantes no sentido de justificar a troca de modelos. No entanto, perguntados do porquê não reabrirem o debate sobre o tema junto à comunidade do CPTEC, já que estavam tão convictos tecnicamente da decisão tomada, preferiram não responder.

- Restou aos membros do CTC repassar o informe desta reunião aos interessados pelo assunto no CPTEC, se colocando à disposição para eventuais novas ações.

São José dos Campos, 25 de agosto de 2018.

Informe redigido por Adalberto Comiran, Maria Lígia Moreira, Carlos Alexandre Wuensche, Marciana Ribeiro, Cláudia Vilega e Gino Genaro (representantes dos servidores junto ao CTC/INPE)

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